terça-feira, 10 de agosto de 2010

Coito interrompido

Se há coisas que detesto é que me interrompam em alturas indevidas, nomeadamente quando estou a fazer amor e o telefone toca, por exemplo. Ou quando o gajo das pizzas engana-se e bate à porta errada, que por acaso é a minha. Fico disléxico. Se eu fosse presidente do Irão accionava logo a bomba atómica.
Felizmente e ainda bem que não sou, caso contrário, isto já tinha ido, pois tantas são as vezes que me acontecesse ser interrompido no momento em que. Há pessoas que parecem que adivinham. Olha, vou cortar o contentamento àquele gajo e trrrimm, trrrimm. É um atentado ao meu machismo, pois acabo por ficar mal perante a parceira. Outras vezes nem me concentro direito só de pensar que porventura alguém virá tocar à campainha logo após os preliminares. As pessoas são burras ou quê? Então elas não sabem o quanto fica estragar a festa? Quem cura os danos que ficam na memória? Deviam saber que da forma como está o país e o mundo, cada erecção custa uma fortuna. E, “levantai hoje de novo” é só mesmo para quem sabe a letra toda.



Há erros que sinceramente deveriam dar pelo menos dez anos de cadeia que é para não haver chance de ninguém nos incomodar. Ou então pô-los outra vez a estudar na escola primária a ver se aprendem de uma vez por todas. Vocês sabem, né, que há erros que nos ferram por dentro. Que é o caso de estar a assistir a um filme japonês e de repente baterem à porta os da Jeová. Ainda por cima duas velhinhas, com ares de vela ardida, a impingir-nos um Deus novo e todo miraculoso; em vez de nos mostrarem as diferenças entre o pau-santo e pau de Cabinda.



É preciso boa dose de paciência para controlar o fogo que me arde nas veias. Detesto estar a ler o jornal, que é meu, comprei-o, e virem-me pedir a página dos classificados ou do horóscopo, por um minuto. Por um minuto, vejam lá. Como se um minuto fosse menos que sessenta segundos.



E eu, olhe, já agora, como estamos na época de empréstimos, podia-me ceder a sua namorada por um minutinho, prometo que a devolvo inteira. Por favor, não me chateiem quando estou a gozar um momento de introspecção. É o mesmo que ir perguntar as horas a um tipo que está há dois dias em meditação sobre um rochedo áspero. Claro que dá bronca, dá barraca, soa o gongo para iniciar o combate.

Vou na estrada, apressado, tenho uma queca para dar daqui a vinte minutos, a polícia faz-me paragem, e eu não tenho outro remédio senão obedecer e chamá-los à razão em Si bemol.

Acham isto bonito? Dá vontade de rir? E se fosse convosco? Havia de haver para estes casos uma sinalização de prioridade. Tipo, quatro piscas e um lenço vermelho de fora do carro para alertar os outros veículos, «desviem-se que tenho pressa para ir dar uma queca». Assim, nada disto acontecia, e chegávamos a tempo.
Perdi de dar uma por causa de uns senhores agentes que me fizeram o favor, e já que estava o tempo fresquinho, mostrarem os seus talentos vocais a duas vozes.

Que seca! Claro que fico amargo, pimentão, tal como estarmos apertadinhos de fazer xixi, já com as calças em baixo, (ou a maneira aberta, depende do usuário) e alguém nos diz, pá não podes fazer aí. O que fazemos? Apertámos a pila e vamos com ela para outro sítio mais apropriado? Humm, não me parece. Há alturas que interromper é um castigo equivalente a ter de adormecer com a voz do Cláudio Ramos ou assistir a um seminário sobre como matar-ratos-e-afins-à-base-da-leitura-de-textos do Miguel Sousa Tavares.



O coito interrompido é outra das broncas. Quem manda interromper, o pai dela, alguma lei de Fev. 1989? A gente ainda está a fazer e já está a pensar em interromper? Onde é que isto chegou?



- E quê, fizeram amor?



- Não, pá, foi coito interrompido.



- Tchiii!



Por que é que ninguém interrompe um padre a dar a missa? E quem tem coragem para interromper um bombista? Ir perguntar-lhe as horas ou convidá-lo para um cafezinho antes da explosão. Evidente que não. Ora, se o homem está concentrado naquilo, a pensar nas 75 virgens, só um idiota é que poderá fazer essa desfeita.



Interromper sai caro, por exemplo, em plena guerra, bombas a cair em todo o lado, disparos, até que alguém se lembra de interromper a guerra. Já imaginou o quanto perdia os fabricantes de artilharia pesada? Os médicos a ganhar sem fazer nenhum, os empreiteiros, as funerárias. E que tal um maestro parar meio minuto de dirigir a orquestra para coçar no traseiro. Não sei qual seria o resultado, mas posso palpitar que ia dar merda. Portanto, peço caridosamente que não me interrompam sempre que estiver a escrever uma crónica, é que, desse modo, perco o controlo da situação e viro o mais profundo ateu, se vocês não acreditam, perguntem às moscas que quando educadamente lhes mandei sair e elas não deram ouvidos. Palminhas!

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