quarta-feira, 1 de junho de 2011

Já não há católicas como havia antigamente

A felicidade é uma coisa linda que habita em nós pecadores. Ser feliz implica ter os tomates bem rijos e um sonho em cada esquina. Mas atenção, se sonhas mais alto que a felicidade, estás literalmente lixado. Falo assim porque já cantei para cima de mil canções. E isso dá-me o direito a trocar os verbos pelos sujeitos ou os sujeitos pelos verbos. Tanto faz, tanto se me deu. À Carolina também. Uma tipa que de mamas são duas mãos cheias. Bastante carecida e com mãozinhas delicadas para bordar paninhos e outras coisas mais que lhe ponham nas mãos. Caiu na minha vida como uma chuva cai na terra sem que olhando para o céu o tempo nada previsse. Foi um momento alto na minha vida. Dois anos a tratar da minha existência como deve ser. Do tipo, assobiar como um canarinho. A crise de valores estava como Deus a deixou: ali, num canto, à espera de dias melhores. Voltei a virar o Cristo para frente, em vez de o ter contra a parede. Havia-lhe dado esse castigo. Mas a Carolina, mulher dada a trocas de experiências, tocou no meu lado mais sentimental, sacando-me da carne e dos ossos o Eu mais profundo, com as suas juras de amor até que a morte nos separe. Tudo nos conformes. Tudo como Deus previra. A Carolina gostava muito de ler em voz alta e eu gostava muito de a ouvir, esperar catolicamente ela terminar a leitura para pôr a escrita em dia. A felicidade, só a cama é que podia contá-la. A Carolina ensinava catequese aos sábados de manhã e tinha um molho de crianças para, entre aspas, dominar. Dizia-lhe que, por mim, havíamos de ter um cento delas. Crianças por todos os lados da casa a darem cabo da neura e da minha pouca honestidade. Mas ela tinha o dom da bondade e do espírito santo. Também cantava no coro e, quando abria as goelas, até o sonho acordava. Voz cristalina como a água a correr. Um talento perdido, mas tudo bem. 
A Carolina não era santa, mas que me levava às nuvens, ai isso levava. Se de dia tinha aquele ar angélico, feita nossa senhora de não sei das quantas, de noite, na companhia deste que vos narra, virava um autêntico furacão, carregadinha de vontades esotéricas. Uma coisa impressionável. Nesse tempo, a minha única missão era dar-lhe assistência.
Mas, o que eu mais gostava mesmo, mesmo, era de me pôr ao sol, até derreter de ócio, e pensar que a felicidade é toda minha! Uma loucura. Um dia, não importa qual o dia, pois o assunto que vos trago é sério, deu-me uma caganeira bem forte. Não se ria. Pois se andasse quinze dias sem se poder sentar, como eu andei, a sua vontade de rir era outra. Tive de ser hospitalizado e a levar injecções nas nalgas que só de me lembrar começa-mas já a doer. Dores idênticas a quem vai parir meia dúzia de filhos pelo mesmo buraco. Ais na boca e no peito. Suores quentes e frios puseram-me a pensar na morte como um condenado à forca. As dores não passavam, nem tão pouco as solturas diminuíam. Às vezes nem me conseguia segurar, no estômago muito menos, e ficava cagadinho de medo só de imaginar que o meu fim estivesse e milímetros. Não havia explicação. Os médicos mandavam-me ir ter com a bruxa. A bruxa, mandava-me ir falar com Deus. Deus, como o costume, a não ralar-se com nada. Com este acontecimento, tinha o presente a ir para o passado. Até à estaca zero. A maldita vida a sorrir-me feita sonça de um ângulo meio obtuso. 
A Carolina a não querer saber de mim, a esquivar-se, e eu a perguntar-lhe onde é que ela meteu a religiosidade. Apenas encolhia os ombros, como se me mandasse meter uma rolha.
Entendi. Como não lhe podia abastecer, pôs-me no olho da rua, bem como as minhas camisas de flanela e os vinis do Manitas de Plata. Dito e feito. Voltei às origens, a viver do que sinto. Sim, viver de sentimentos. Uma coisa por mim inventada. Os meus amigos ficaram felizes ao saberem que voltei para a violência do meu quarto, a andar por aí, de receita médica na mão a mostrar a toda a gente. Eu era o escritor, mas quem deu a volta ao texto foi ela, aquela cabrona da Carolina, a papa hóstia. 
Tantas promessas para nada. Tanto investimento em sexo e vitalidade para nada. Tantas idas a colóquios sobre planeamento familiar e niente, como dizem os italianos. Sem falar no dinheiro gasto em alianças. E eu agora aqui, tão neutro, sem uma janelita para o mundo quanto mais uma porta. Para o bem da minha felicidade, uma lição aprendi. E fiz uma cruz. À próxima que me vier fazer olhinhos, antes de tudo, perguntar-lhe-ei: És católica? Se ela disser que sim, então responderei: Nada feito. Com católicas, nem de borla!

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